Fases

Então, veja bem... Esse texto foi publicado em 30 de novembro de 2016. Como nada realmente desaparece na internet, não faz tanto sentido deletá-lo; mais fácil mantê-lo, nem que seja pra satisfazer alguma curiosidade posterior... Apenas saiba que há uma boa chance de ele estar desatualizado, ser super cringe, ou conter alguma opinião ou análise com a qual eu não concordo mais. Se quiser questionar qual dos três é o caso, deixe um comentário!

A crença na infalibilidade do tempo enquanto agente impessoal de inexorável transformação é uma deturpação daquilo que já se dizia com Heráclito – quanto ao fato de que a mudança está sempre presente no universo. Isso nos torna mais e mais submissos a uma condição que é tanto social quanto natural, a saber, o tempo e suas propriedades por nós atribuídas, em especial em relação à idade.

Ter uma idade para fazer as coisas é criar um conjunto de pré-julgamentos sociais em relação a atitudes, mas há mais que isso em toda essa querela com o tempo: não apenas se faz necessário ser de uma maneira ou não ser de uma maneira de acordo com o tempo, como aquilo que não é aceito torna-se uma fase; algo que tivesse uma essencial data de validade anexa.

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Ora, uma tendência, um comportamento, não se transformam (sob a influência de posterior reflexão) em uma fase simplesmente porque isso acontece. Como uma criança birrenta cujo comportamento abusivo é aceito já que é apenas uma fase. Pode ser uma fase ou pode não ser: a não-interferência pode acabar significando que as mesmas características continuem se manifestando. Talvez transformadas, sim, mas então a minúcia daquilo que constitui ou não uma fase (ou um sintoma) tornam toda a discussão irrelevante por falta de critério – se a birra continua, mesmo que canalizada, disfarçada, e não se lida com ela, a fase não passou.

Há coisas que nunca são vistas como fases. Está fumando maconha? Não é fase, que passa; é um problema seriíssimo que necessita de muita conversa, cuidado e atenção. Adora jogar vídeo game? Isso é coisa que passa. Ou não?

Isso tudo faz parte dos discursos da época… Há muito envolvido nisso. Side-effect da mesma problemática é o modo como sempre se espera a degeneração de tudo que é bom – especialmente em termos de relações humanas. Qual casal de namorados nunca ouviu que “no primeiro ano é tudo flores… Depois tudo piora”. Quantos casais não estariam ainda juntos, pergunto-me, se adotassem uma postura proveniente de um conselho diferente e não-determinista como este: “a qualquer hora, sem aviso ou tendência, seu relacionamento pode piorar, melhorar ou permanecer com a mesma qualidade”.