Da aproximação entre o fazer literário e a vida

Então, veja bem... Esse texto foi publicado em 19 de abril de 2016. Como nada realmente desaparece na internet, não faz tanto sentido deletá-lo; mais fácil mantê-lo, nem que seja pra satisfazer alguma curiosidade posterior... Apenas saiba que há uma boa chance de ele estar desatualizado, ser super cringe, ou conter alguma opinião ou análise com a qual eu não concordo mais. Se quiser questionar qual dos três é o caso, deixe um comentário!
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Photo by the euskadi 11

Quando crio uma história (enquanto escritor) primeiro vem a ideia: a situação, o desenvolvimento, o conflito, a premissa. Depois disso vêm os personagens necessários – e as peças cenográficas que, na interação sofrida a partir das ações desses personagens, vão construindo essa premissa. Isso não é um engessamento dos personagens: no fundo eles sempre existiram a partir da situação, a partir da premissa. Foram eles que colocaram-na em movimento em primeiro lugar, só que você não sabia disso; vem mais fácil à cabeça a situação, a figura completa, com a embalagem por fora, do que seus mecanismos internos. Mas eles estão lá, e por isso são necessários. Você não consegue imaginar aquela história sem eles – J. K. Rowling disse que a história de Harry Potter veio inteira, completa, durante uma viagem de trem. E é certo, pode apostar, que Harry, Ron, Hermione, Voldemort, Dumbledore, todos esses e talvez mais alguns (Snape?) estavam lá desde o princípio, desde a primeira semente de ideia.

Aí, por último, vem a vida própria: vem aquilo que os personagens precisam ter que para que haja um desenvolvimento da premissa, para que haja uma história em si: uma narrativa, uma trajetória, uma transformação – uma ação. Você precisa deixar os personagens falarem por si, e suas decisões terem suas consequências, e você deve aceitar as reverberações disso de uma forma tal que, depois de um tempo, as lógicas dos personagens se tornam vidas dos personagens e eles, vivos, são capazes de determinar o destino da trama a partir de seus desenvolvimentos. Nesse ponto é que pode ocorrer o engessamento, se o autor não respeita as vozes dos personagens e decide continuar com um plano anteriormente definido; não, é preciso ouvi-los e segui-los ao invés disso.

Com a vida a coisa é parecida. Não que primeiro venha a sociedade e depois o indivíduo, mas a forma como nós nos aclimatamos, como nos “aculturamos”, como “aprendemos a ser gente”, indica que temos uma certa situação, sempre prenha de um conflito, toda uma premissa cultural que nos guia simbolicamente até começarmos a viver de acordo com certas necessidades. Por isso toda nossa vida, especialmente na forma como vemos a história (uma linha e não um ciclo) é uma trajetória no sentido de uma narrativa mesmo: uma mudança, uma ação que gera transformação. Começamos com essa premissa dentro de nós, muitas vezes servindo como personagens necessários para uma determinada situação cultural, e aí então, a partir dessas possibilidades e desses limites, podemos ser protagonistas para efetivar uma transformação e sermos diferentes.