Que Mal eu Fiz a Deus

Produzido por um dos alunos do curso: Trabalhar o filme “Que mal eu fiz a Deus” trazendo à tona a questão do preconceito racial/cultural bem como a xenofobia. Pelo caráter multicultural apresentado no filme e como essas culturas estão entrelaçadas, trazer contribuições para a desconstrução dos preconceitos estabelecidos através do cotidiano dos alunos e relacioná-los/compará- los com as situações dos personagens dos filmes. Correlacionar conceitos sociológicos e antropológicos para dar suporte as discussões.

Antes do Filme

Breve discussão acerca dos preconceitos com pessoas vindas de outras cidades, bem como outras culturas. Fazer relações e questionamentos se alguém em sala é de outra cidade, (ou conhece alguém que é) quando veio, por que veio e se houveram alguns contrastes em relação a sua cultura com a cultura da atual cidade. Questões de se foram “bem recebidas” ou sofreram algum tipo de preconceito (ou conhecem alguém) por serem de um determinado local ou partícipes de alguma cultura estigmatizada, rotulada.

Após o filme

Depois da exibição do filme, solicitar aos alunos que apresentem cenas onde o preconceito/xenofobia foram detectados. Após as respectivas identificações fazer analogias com o cotidiano dos respectivos alunos, se há semelhanças com o que acontece no filme (ficção) com o cotidiano. Com isso trazer para o debate, com um enfoque antropológico, os conceitos de Lévi Strauss trabalha a questão da interação entre sociedades diferentes com algo positivo e que caracteriza a cultura como algo dinâmico e não estático e imutável. Para corroborar ainda mais com o debate trazer também, agora com enfoque mais sociológico, noções do Autor Norbert Elias, sobre os Outsiders, pessoas que possuem valores e costumes diferentes da sociedade na qual estão inseridas.

Avaliação

Solicitar uma pequena redação, após a exibição do filme e todo o debate, sobre como podemos romper as barreiras do preconceito/xenofobia utilizando-se dos conceitos de Strauss e Elias.

Meu feedback

Ótimo projeto! No entanto, como conversado em nossa comunicação por email, deixo aqui algumas sugestões de coisas que não ficaram muito explícitas no projeto ou sugestões de adição :)

A discussão proposta anterior ao filme, se ela for bem aberta e contar com a participação dos alunos, eu acho que vai ser uma experiência interessante, mas não fica claro como o filme vai 1) ampliá-la em uma direção significativa, ou 2) aproximar os alunos da teoria. Há também algumas questões também a se pensar, como se nenhum ou poucos alunos tiverem vindo de outra cidade, se os alunos não quiserem (por desconforto coletivo) discutir o assunto, etc. É preciso estar atento a essas dinâmicas e se preparar com um plano B, quem sabe uma forma indireta de abordar o tema; uma técnica seria separar em grupos menores, pq talvez ele se sintam mais à vontade de falar entre amigos do que no grande grupo todo de uma vez. Outra é talvez inverter um pouco a ordem das coisas – discutir alguma coisa um pouco mais teórica primeiro, depois passar o filme, e já que o filme possa revelar situações paralelas eles possam identificá-las depois e estejam mais dispostos a discutir questões pessoais, talvez até dinâmicas internas à sala…

Uma das perguntas que se poderia fazer na discussão aberta é: por quê? Por que isso acontece? Por que as pessoas criam (Elias*) / têm preconceitos? E aí a gente pode chegar por exemplo a discussões até de caráter mais psicológico / filosófico sobre vieses cognitivos, que é uma questão muito importante. Mas também dinâmicas de poder: preconceitos como instrumentos para criar ou manter uma relação de poder. O quanto que não se poderia discutir, digamos, entre eles, introduzindo essas hipóteses e vendo o que eles acham? Perguntar, por exemplo, se as pessoas têm preconceitos porque são burras, mal informadas, malvadas, porque se beneficiam deles, ou porque… Por quê?

Lembre que o foco principal do estudo do Elias é que o preconceito não vinha de nenhum fator a não ser o fato de que as pessoas chegaram na comunidade depois. Isso que é notável. não era racismo, não era elitismo, não eram hábitos culturais, nada. Era um critério completamente aleatório.

Por exemplo, partindo da pergunta “por que existe preconceito?”, pra mim o filme seria interessante se, em vez de perguntar pra eles se eles identificaram situações de preconceito ali – é claro que vão identificar – perguntar pra eles se em cada caso eles conseguiriam explicar… de onde vem o preconceito.

Por exemplo, a religião me parece ser um fator essencial do filme. Mas nós vemos que, embora em muitos pontos da história religiões motivaram preconceitos e guerras, em muitos outros religiões diferentes coexistiram pacificamente. Será que existem características de algumas religiões que as tornam mais tolerantes que outras? Ou há uma potência inerente a toda religião (como por exemplo a força ativa que ela tem unindo seus membros em uma comunidade coesa) que faz com que toda religião corra o perigo de justificar discriminação e violência? Eu não acho que isso tenha uma resposta óbvia, isso é hiper complexo. Mas é uma coisa que vai deixar eles encucados – e aí dá pra procurar mostrar como pensar essas questões não pelo senso comum, não pelo umbiguismo, mas filosoficamente.

E como que o filme pode ajudar a pensar essas coisas? Ora, parece que a igreja (naquela cena em que eles cantam juntos) é um cenário importante. E nela certamente não estão só os personagens, mas toda comunidade. O que significa que a comunidade toda da igreja “ache estranho” que aquelas pessoas diferentes estejam cantando juntos? Ninguém acha estranho quando pessoas diferentes cantam juntos o tema de fim de ano da Globo. Mas por que dentro da igreja o pessoal olhou torto? Que expectativas a comunidade coloca sobre os ombros do sogro? Então dá pra ir além da questão de “onde está o preconceito nas cenas” e ir analisando elas mais a fundo.

Você pode ver com os alunos se a religião é um fator integrador da comunidade deles. E em muuuitos contextos é. O nosso próprio colega de encontros, que veio lá de Itajaí, fala como a religião é importante pros seus alunos – certamente pra muitos não por um arrebatamento espiritual inexplicável, mas porque é um fator integrador de sua comunidade. Todo mundo vai na igreja, todo mundo se conhece na igreja, aquele dia quando minha família teve dificuldade foi o pastor que ajudou, ou as pessoas da igreja… É o lugar onde pertenço, é o lugar que tem pessoas em quem confio. E isso tá amarrado na crença de que existe, sei lá, um Deus e ele é assim e assado. Aí vem uma pessoa e diz, sei lá, que Deus é outro? Ou que Deus nem existe? Iiiihh, sei não, essa pessoa aí…

Coisas que dá pra fazer: perguntar junto aos alunos se eles conseguem identificar “categorias” de preconceitos diferentes. Não estou dizendo que elas existem, eu não sei; é um exercício de imaginação, ver que critérios eles podem identificar, se houver. Talvez alguns preconceitos seja por cor da pele (característica) enquanto outros sejam por religião (comportamento). E a questão econômica? Algum deles é mais pobre ou mais rico, e isso faz diferença no filme?

Perguntar pra eles qual é o impacto da questão econômica nos preconceitos que eles possam ter vivido / conhecido com outros. Outra questão é o gênero. Todas filhas mulheres, e a relação de preconceito é (pelo que entendi) principalmente entre homens. Olha só a tonelada de questões que dá pra fazer sobre isso. E dá pra julgar o filme: estaria ele idealizando demais as mulheres (sem querer?), ou isso é mais ou menos o que ocorre mesmo? Quão “realista” o filme é nesse sentido, e como eles sentem isso nas vidas e nas comunidades e nas famílias deles? Há dados, pesquisas sociólogicas sobre se homens são mais preconceituosos que mulheres? No Brasil? No mundo?

Mais uma coisa, essa dá pra amarrar com a teoria, ao menos Strauss: e o final do filme? O que aconteceria com os personagens se eles não tivessem se dado bem? Será que é possível extrapolar pras culturas que representam – o quanto a interação entre as culturas beneficiou cada uma daquelas ali? Etc.

De todo modo, ótimo projeto! São apenas sugestões de coisas que não ficaram explícitas ou poderiam ser adicionadas :)